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Blogueiros e turismo responsável: que tipo de influência queremos exercer?

BY: Luisa Ferreira dos Santos0 COMMENTS CATEGORY: Criação de conteúdo, Mercado

Apesar da controvérsia em torno do termo “influencer”, não há como negar que o trabalho de produtores de conteúdo costuma influenciar comportamentos e decisões. Ao divulgar informações sobre viagens, muitos de nós falamos que nosso objetivo é “inspirar” quem consome esse conteúdo. Mas inspirar a quê?

A aprender a tirar fotos bonitas com looks que combinem com o cenário? A colecionar carimbos no passaporte? A competir pelo melhor estilo de vida? A lotar os mesmos destinos turísticos, provocando o chamado “overtourism”? Ou a crescer como pessoas, aprender sobre o mundo e provocar impactos realmente positivos além dos nossos umbigos?

Grande poder, grande responsabilidade

Uma pesquisa do Booking.com mostrou que para 42% dos brasileiros, “um dos fatores considerados ao escolher uma acomodação é se hospedar em propriedades atraentes onde eles possam tirar fotos para utilizar nas redes sociais”.

Imagina que incrível se essa mesma quantidade de gente considerasse importante saber se uma hospedagem tem práticas ambientalmente e socialmente responsáveis, por exemplo? Imagina se todos nós usássemos nosso “poder de influência” para estimular comportamentos desse tipo?

Aquele conselho bem batido do tio do Homem-Aranha cai bem nesse cenário: com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades. Mesmo quem não tem uma audiência massiva provoca algum tipo de influência em seus leitores ou seguidores. Não é possível, então, ignorar o peso das escolhas que fazemos ao viajar e divulgar nossas viagens.

Se acreditamos que “vale tudo pelo conteúdo” e tiramos fotos em lugares proibidos ou perigosos, participamos de atrações que prejudicam animais ou divulgamos eventos que promovem destruição ambiental, que tipo de valores estamos promovendo? Que comportamentos vamos incentivar?

O mundo não é nosso parque de diversões

Muita gente vê viagens como merecidos momentos de descanso e descontração, e não há nada de mau nisso por si só. O problema é quando isso nos faz esquecer que os lugares que visitamos não estão lá exclusivamente para servir a nosso divertimento ou contemplação. Pessoas moram e trabalham neles, e existe todo um ecossistema ali que sente o impacto da nossa presença.

Nesse sentido, o mínimo que podemos fazer é respeitar os destinos. Isso envolve, por exemplo, entender como se vestir e como agir para não desrespeitar a cultura local, especialmente quando ela é muito diferente da nossa. Mas vai além disso.

É preciso, em diversas ocasiões, questionar continuamente o impacto das nossas ações. E, sempre que possível, transmitir esse questionamento ao público que acompanha nossas viagens.

Será que essa pessoa se incomoda em ser fotografada? Para onde irá o lixo resultante daquelas lindas lanternas que enfeitam o céu? O que será que faz com que esse animal selvagem se comporte de forma tão amigável junto a humanos? Será que esse destino tem capacidade para suportar um fluxo tão pesado de visitantes ao mesmo tempo?

Desde o impacto no efeito estufa a profundos danos ambientais em lugares como a Maya Bay, na Tailândia, passando por aumentos estratosféricos nos preços de aluguéis que forçam moradores a sair dos bairros onde cresceram, não há dúvidas de que em muitos casos o turismo age como vilão.

Como blogueiros de viagens, acredito que temos o papel de refletir e debater sobre esses cenários de forma realista, em vez de pintar o mundo e as viagens de cor de rosa, mostrando só o lado bom.

Sempre é tempo de aprender

É claro que os maiores danos causados pela indústria do turismo estão muito além do que conseguimos influenciar com um simples post no Instagram. O problema envolve má gestão de políticas públicas, ganância e descaso a nível mundial.

Mas será que isso nos dá o direito de lavar as mãos, ou é mais um motivo para mantermos nosso senso crítico ainda mais alerta e apoiarmos iniciativas responsáveis?

Já fiz muita coisa errada como viajante e como blogueira de viagens sem ter consciência disso. A gente não nasce sabendo de tudo, nem sempre os limites são claros e às vezes é difícil entender as consequências de ações (nossas ou de grandes empresas) que estão normalizadas na sociedade.

Mas só assim vamos melhorando como pessoas, viajantes e “influenciadores”: um passinho de cada vez, aprendendo uns com os outros.

O turismo pode ser uma ferramenta incrível de transformação pessoal, distribuição de renda e trocas culturais. Mas para que consigamos ampliar esse papel positivo e reduzir seu lado nocivo, precisamos fazer escolhas cada vez mais conscientes e nos perguntar a cada post: que influência queremos exercer?

Luísa Ferreira é jornalista e autora do blog de viagens Janelas Abertas.

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